Old Gamer VS New Gamer

Sempre há, especialmente de muitos old gamers, aquela constatação de que “Por que no meu tempo, os jogos eram mais difíceis” ou “no meu tempo, pegar vidas era mais importante. Hoje a vida não vale nada“. Já alguns new gamers, dizem:  “Hoje é muito melhor, naquele tempo os jogos eram mais simplórios, eram mais coisas de crianças“.

Ok, vamos refletir sobre tudo isso?

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“Por que no meu tempo, os jogos eram mais difíceis.”

Bom, nós precisamos voltar no tempo e ver qual foi a intenção da indústria de deixar os games mais difíceis naquela época. Como sabemos, antes dos consoles caseiros, existiam os fliperamas, que inicialmente eram constituídos apenas de máquinas Pinball e depois, foram acrescentados os jogos eletrônicos. Sim, os jogos eram muito difíceis.

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A explicação para esse fator se chama: Modelo de negócios lucrativo.

É isso mesmo. Para quem frequentou os fliperamas como eu, sabemos que os jogos eram programados com certa dificuldade, para que o jogador perdesse a vida o mais rápido possível e assim, tivesse que comprar mais fichas. Isso permitia uma grande e constante rotatividade das máquinas, gerando mais lucro aos donos dos estabelecimentos, que por sua vez compravam mais aparelhos e mais jogos, fazendo as desenvolvedoras lucrarem também nesse processo.

Esse modelo fez com que cimentasse na cabeça das desenvolvedoras de jogos da época essa premissa de que os jogos teriam que ser difíceis e desafiadores.

Assim, especialmente até a geração 16 bits, como os jogos ou foram ports feitos dos arcades, ou eram construídos ainda com essa mentalidade de modelo de mercado, havia neles essa dificuldade excessiva. Isto já responde a segunda frase: “No meu tempo, pegar vidas era mais importante. Hoje a vida não vale nada.”. Sim, a vida era importante, pois dava ao jogador a chance de poder morrer, sem que o jogo reiniciasse e todos os esforços terem sido em vão. Isso porque alguns dos jogos não possuíam continues. Ou seja, a vida valia MUITO.

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Outro fator que corrobora para o modelo de jogos do passado era a simplicidade destes, comparados com os de hoje. Não havia roteiro, desenvolvimento de personagens, caminhos alternativos, liberdade de andar por onde o jogador quisesse. A grande maioria dos jogos era sidescrolling, ou seja, visão de jogo onde o personagem se movia da direita pra esquerda, ou vice-versa.

Dessa maneira, o diferencial entre os jogos era realmente o desafio que eles ofereciam. Alguns eram difíceis, outros eram quase proibitivos. Muitos ainda requeriam que o jogador passasse por certos trechos por diversas vezes, a fim de decorar a aparição e os movimentos dos inimigos, sendo quase impossível passar de primeira.

Com o tempo, os consoles caseiros começaram a fazer mais sucesso que os fliperamas. Um número maior de pessoas passou a ter videogames em casa. Se iam aos flipers, era mais pelo motivo de irem ao shopping e aproveitar para dar uma jogadinha. Assim, a indústria começou a optar mais para o público que tinha os consoles em casa e o cenário começou a mudar.

O início foi na 5ª geração, que foi a geração do grande salto de tecnologia, onde os jogos passaram de sidescrolling para 3 dimensões. Isso gerou uma mudança de percepção tanto de quem desenvolve, quanto quem joga. Começou-se a ter um cuidado maior com a história, com personagens, pois agora a tecnologia permitia criar todo um contexto no qual o personagem do jogo estava inserido. Isto não era possível nas gerações passadas, devido à pouca memória que um cartucho possuía.

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Podemos aproveitar a deixa deste último parágrafo para colocar a última frase: “Hoje é muito melhor, naquele tempo os jogos eram mais simplórios, eram mais “coisas de crianças”.”

Bom, melhor ou pior, isso vai da opinião de cada um. Tem aqueles que acham os jogos de Mega Drive e Super Nintendo melhores dos que os feitos hoje, e vice-versa, mas não entrarei nesse mérito aqui. Que os jogos eram mais simples, isso já discutimos. Agora o fato de que eram “coisas de crianças”, isso sim vale a pena conversar.

A visão das desenvolvedoras, inicialmente, não foi de desenvolver games pra crianças. Jogos eram coisas caras e sérias, que começaram lá atrás, com um cientista nuclear criando o primeiro jogo a partir do osciloscópio, que depois virou projeto de estudantes do M.I.T., onde os primeiros games eram mantidos em grandes computadores, com acesso extremamente restrito. Pra quem não sabe o que é osciloscópio, era um aparelho utilizado para medir sinais elétricos (ou eletrônicos), que foi transformado em game. Se liga na foto aí de baixo.

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O próprio Atari 2600 não era um aparelho feito pra crianças. Não entrarei em muitos detalhes aqui, mas jogos como Bachelor Party, Beat’Em & Eat’Em, Custer’s Revenge, Playaround e X-Man (sim, com “a” mesmo) não eram jogos para atrair o público infantil. Assim, o alvo principal das primeiras duas gerações não eram os pequeninos. Tive que censurar a imagem do jogo pra postar aqui, pra vocês terem uma noção. Saca só.

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Tudo isso mudou com o crash dos videogames de 83 (assunto que quero trazer em outro artigo), onde a Nintendo reinventou o videogame. Com um hardware melhorado do que já havia no mercado, a empresa Japonesa trouxe um conceito de jogos em família, onde o pai, a mãe e os filhos podem jogar juntos, na sala de estar. Até o nome já era sugestivo, Family Computer ou, Famicom no Japão e 2 anos depois, como Nintendo Entertainment System, ou NES, no ocidente.

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Os jogos eram mais divertidos, coloridos e lúdicos, feitos para atrair  jogadores de todas as idades. Mas claro, as crianças piravam quando viam. Desde então, os videogames saíram do poço onde se encontravam, quase extintos do mercado, e emergiram novamente com muito mais força. Pronto, o novo modelo de mercado estava pavimentado. Os mascotes entraram em cena, os jogos cada vez mais coloridos e lúdicos. Sucesso total.

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Sim, estou afirmado que videogame era “coisa de criança”, pois o foco do mercado, naquela época (8 e 16 bits) era isso mesmo. E não há nada de errado em alegar isso. Ser considerado “coisa de criança”, não é sinônimo de baixa qualidade.

Bom, mas por que os jogos mudaram tanto? Por que as crianças não são ainda o foco principal? Por que os jogos ficaram mais fáceis?

A partir da geração 32 bits, a indústria viu que podia fazer mais com essa tecnologia. Pessoas realmente interessadas em contar uma boa estória viram nos games sua saída perfeita para tal.

Percebeu-se ali, uma brecha para mudanças. Mudanças estas que levaram a indústria dos games ao patamar onde se encontra hoje.

O foco agora são os jogos cinematográficos. Atores encaram a pele dos personagens dos jogos, há roteiro, há histórias, tramas, trilhas sonoras, há desenvolvimento de personagens, há um trabalho artístico digno dos melhores prêmios do gênero e até plot twists em alguns casos. Até o Kevin Spacey mano, que é um dos melhores atores existentes, já encarou um personagem no Call of Duty: Advanced Warfare.

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Claro, existem inúmeros jogos com temáticas mais lúdicas, jogos mais simples que apostam nos conceitos mais antigos e que dão muito certo também. Isso prova que há espaço e lugar para todos os tipos de jogos e para todas as idades.

Os jogos indies estão aí para apoiar essa ideia, de que nem todos os games precisam ser realizados com equipes gigantes em projetos multimilionários. Como também, os jogos mais lúdicos não são necessariamente os mais simples, ou que vendem menos. Jogos como Zelda, Mario, Mincecraft, Pokémon, etc., vendem como água até hoje.

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O que quero dizer é que a veia principal, a coluna vertebral da indústria como um todo, mudou.

Assim, o foco hoje por ser a história contada, não casa bem com dificuldades extremas ou desafiadoras, ou ainda coletar vidas ou continues. Veja, seria bem complicado coletar vidas em Uncharted, né?

Por isso hoje existem os checkpoints, permitindo aos jogadores recomeçaram a partida, praticamente do ponto onde morreram na rodada anterior. Isso auxilia a levar a trama pra frente e não travar o jogo, não havendo a necessidade de recomeçar do zero. O realismo buscado hoje nos games não permite espaço para vidas ou continues, pois o foco de hoje é totalmente diferente.

Então, antes de julgarmos os jogos de ontem e de hoje, vale a reflexão da época, da tecnologia e da mentalidade do mercado, pois isto dita o caminho em que os desenvolvedores seguirão para atender a demanda existente.

Acredito que todos os jogos tenham seu valor, sendo os antigos por seu gameplay desafiador e extremamente divertidos, como os jogos mais recentes, com seus gráficos e estórias exuberantes.

O que quero deixar como mensagem é que não podemos ter a mente fechada. Sabemos que a indústria dos games, assim como qualquer outra indústria, está em constante desenvolvimento e evolução. Então, se nas próximas décadas o mercado mudar e ditar outras regras, tenhamos a mente aberta para as novidades que surgirem, valorizando também o que o passado nos deixou como lembranças.