Vídeo-Games, violência e a imprensa

Antes de mais nada, quero deixar claro que esse post representa o meu ponto de vista, não sendo necessariamente a opinião da equipe do Blog.

Hoje ao dar aquela procrastinada que é de costume, acabei me deparando com uma notícia das mais tristes:

“Menino de 9 anos atira e mata irmã por causa de video-game”.

Além da tragédia por si só, a abordagem do assunto acabou me causando uma certa preocupação, já que uma lida rápida dessa manchete pode dar a entender que a culpa da morte foi o video-game. Não seria a primeira vez que a imprensa colocaria os jogos eletrônicos na posição de vilões e culpados por crimes hediondos, varrendo pra debaixo do tapete os motivos que levam uma criança a cometer uma violência dessas. Alienação parental? Problemas mentais? Casco azul na linha de chegada?

Independente do que for, a causa foi simples: o menino tinha acesso a uma arma, pegou e atirou na irmã depois de uma discussão sobre um controle de vídeo-game. Mas vejam como o agente facilitador do crime, a arma, fica em segundo plano na manchete.

Para alguns pode parecer óbvia a mensagem: “Garoto mata irmã POR CAUSA do videogame”, mas dado o nível de interpretação de texto e a capacidade de leitura de manchete da maioria dos internautas, a mensagem pra muitos será “Garoto mata irmã POR CULPA do videogame”.

Foi o video game que matou, ele é o culpado. Daí pra isso cair nas mãos de um dos nobres e canalhas deputados e senadores que tão bem assaltam os cofres públicos representam o povo brasileiro e o caso ser totalmente deturpado pra virar plataforma de campanha é um pulo.

Não é de hoje que os abutres do poder legislativo se aproveitam desse tipo de comoção pra se promover. Lembram do “polêmico” Carmaggedon? Lançado em 1997 o jogo ficou famoso por ter um objetivo um tanto quanto peculiar: atropelar pessoas, quebrar coisas e com isso acumular pontos. Era tão boba a proposta que ninguém levaria a sério, até que o hoje nobre senador Renan Calheiros (então Ministro da Justiça – RISOS) resolveu agir e determinar ao órgão de proteção e defesa do consumidor que proibisse a comercialização do jogo. Acabou que isso tornou o jogo ainda mais popular e o tiro saiu pela culatra.

Curiosidade: O jogo continua proibido até hoje, 21 anos depois  do seu lançamento e de há muito tempo já ter caído na irrelevância.

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Detalhe que Renan Calheiros não gosta de joguinho violento, mas não é pequena a lista de acusações criminais contra a sua pessoa. Ou seja, não é o jogo, mas a índole que faz um criminoso.

Se a moda pega, daqui a pouco vai ter gente falando em criminalizar os vídeo-games. Já pensou, o guarda te aborda, abre sua mochila e vê um 3DS. “É pra consumo próprio”, você diz, mas não adianta. Tá preso por porte ilegal de jogos eletrônicos. E a galera vai defender a prisão, afinal “gamer bom é gamer morto”, e “tá com pena, leva pra casa”.

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Ironias à parte, o cenário não chegaria a tanto, mas poderia virar uma regra: é violento? Proíbe.

“Ah Fernando, mas jogo violento mexe com a cabeça das crianças”. Sim, não é por acaso que eles tem classificação indicativa. GTA não é pra crianças, mas quantos pais que simplesmente largam os filhos sozinhos jogando? Aí o filho comete uma atrocidade e os vampiros da imprensa brasileira, sedentos de sangue, aproveitam. Todo canto vai aparecer um detonando os jogos e colhendo os louros disso, mesmo sem entender PORRA NENHUMA do assunto.

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E o pior? Muita gente vai no embalo e defende. A polêmica gera votos e audiência.

Antes que digam que é birra minha, vejam a diferença de tratamento de um veículo da imprensa internacional (CNN) sobre o caso:

“A 9-year-old boy retrieved a gun from his parents’ bedroom and shot his 13-year-old sister to death after the two got into an argument over a video game controller, authorities say”

Traduzindo: “Autoridades afimam que um garoto de 9 anos pegou uma arma no quarto dos seus pais e matou sua irmã de 13 anos com um tiro depois de discutirem sobre um controle de video-game”.

Olhem só como o vídeo-game é um mero detalhe nisso tudo, o foco é que o guri PEGOU UMA ARMA E MATOU A IRMÃ. O resto é irrelevante. Isso que eu sinto falta na nossa imprensa, informar corretamente e não utilizar pra auto promoção.

Lembram do falecido Marcelo Rezende, quando apresentou Assassin’s Creed e afirmou que o título do jogo significava “Assassinos com certeza absoluta”? Pensem quantos pais, tios, avós e parentes em geral não ficaram horrorizados com essa informação e a partir daí criaram uma imagem totalmente negativa a respeito do jogo? E se de repente alguém quisesse proibir, vocês acham que eles seriam contra? É um ponto preocupante e perfeitamente possível de acontecer um dia.

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fonte da imagem: http://torredosgurus.com.br

“Tá bom, mas onde você quer chegar com tudo isso afinal?”

Excelente pergunta! Nem eu sei direito.

Acho que quero chegar no ponto em que os video-games param de ser vistos com o preconceito que existe hoje. Não tem meio termo, ou é coisa de criança ou é uma fábrica de assassinos.

Dá pra ter jogos “infantis” e “adultos” e ambos conviverem harmoniosamente. Dá pra se divertir com as crianças montando blocos no Lego e depois que elas dormirem ir até Marte matar uns demônios, só basta que os pais (ou responsáveis) estejam por perto e dando uma olhadinha de vez em quando pra ter certeza de que ninguém tá jogando o que não foi feito pra ele.

Não quero transformar esse post em militância contra ou a favor do desarmamento, já que isso demandaria uma discussão mais aprofundada e que fugiria totalmente da proposta do Blog, mas vamos deixar uma coisa bem clara:

Video-games não matam pessoas.

Armas na mão de pessoas emocionalmente instáveis¹ matam pessoas.

Bora jogar e se divertir!


¹ emocionalmente instável: qualquer pessoa em algum momento da sua vida.

Fmrbass

Fã de Zelda e adepto da Nintendo desde que se conhece por gente. Fora um Atari e um Mega Drive, todos os seus outros consoles foram Nintendo. Nunca teve um Playstation ou Xbox (e nem pretende ter), já que nunca viu motivo pra isso.